Um estudo realizado pelo Comitê Brasileiro de Arbitragem (CBAr) mostra que os litígios decididos por meio da arbitragem comercial contaram com árbitras na composição de 52% dos tribunais arbitrais formados por três membros. Registrou-se também a participação de mulheres em tribunais formados por um único árbitro e a implementação de políticas e ações de fomento à diversidade nas instituições arbitrais.
Este é o primeiro levantamento no Brasil sobre o tema de diversidade para o segmento de arbitragem e foi realizado pelo Grupo de Estudos sobre Arbitragem e Diversidade do CBAr, criado em 2020. O levantamento contemplou procedimentos arbitrais realizados entre 2016 e 2020, administrados por 11 instituições arbitrais com atuação no Brasil.
Nos tribunais arbitrais formados por três membros, o estudo mostra que 50% foram compostos por homens e mulheres, 48% exclusivamente por homens e 2% exclusivamente por mulheres.
Foi constatada melhora na paridade de gênero com relação à função de presidência destes tribunais, com um aumento de 140% nas indicações de árbitras presidentes, comparando 2016 (32 mulheres presidente) e 2020 (77 mulheres presidente). Em 2020, um total de 43% dos tribunais analisados foram presididos por mulheres. No consolidado total de indicações de presidentes de tribunais arbitrais, no período analisado, 29,7% foram de mulheres.
Segundo a advogada Ana Carolina Weber, coordenadora da pesquisa, “mesmo que os dados, em termos comparativos, indiquem ainda significativa desproporção de gênero, é relevante notar a presença de ao menos uma mulher em mais da metade dos procedimentos arbitrais em curso no período em análise e também um crescimento de tribunais formados somente por árbitras e presididos por mulheres”.
Já nos procedimentos em tribunais arbitrais compostos por um único árbitro ou árbitra, a proporção dos casos no período ficou em 30% por mulheres e 70% por homens. Neste formato de tribunal, houve um aumento de 64,2% dos processos decididos por mulheres no comparativo de 2016 e 2020.
No consolidado das nomeações de árbitros realizadas, no universo de 3.056 indicações nos procedimentos arbitrais instaurados entre 2016 e 2020, 22,5% foram de mulheres. A evolução também foi gradativa ano a ano, saindo de 15,2% das nomeações em 2016 e alcançando 27,8% em 2020. Tais dados, no entanto, não refletiram eventuais repetições de nomes de mulheres, questão que o grupo pretende enfrentar em futuras análises.
Iniciativas das instituições de arbitragem
A pesquisa também abordou como as câmaras e centros de arbitragem estão lidando com o tema de diversidade de gênero. Foi identificado que 64% das instituições são signatárias do Equal Representation in Arbitration Pledge (“ERA Pledge”), um compromisso lançado em 2015 na comunidade internacional de arbitragem para aumentar, com base na igualdade de oportunidades, o número de mulheres nomeadas como árbitras, a fim de alcançar uma representação justa o mais rápido possível, com o objetivo final de plena paridade.
Além deste compromisso, o mesmo percentual (64%) indicou ter iniciativas próprias relacionadas à promoção da diversidade, tanto no serviço administrativo e de gestão das instituições, quanto na indicação de árbitras e árbitros quando esta for realizada pela instituição. Entre as ações, a maioria das instituições organiza eventos, implementa políticas de governança corporativa focadas para público interno e participa de seminários e workshops sobre diversidade. Foram também identificadas iniciativas para inclusão mais diversa de novos integrantes nas listas de árbitros.
Para Weber, “as iniciativas das instituições arbitrais que passaram a se vincular ao ERA Pledge e as políticas próprias que vêm sendo adotadas revelam que as instituições foram, ao longo do tempo pesquisado, identificando a importância do tema e a necessidade de adotar medidas com o intuito de promover a diversidade”.
Sobre o quadro de funcionários, o levantamento identificou que as mulheres são maioria na parte administrativa e de gestão das instituições arbitrais, ocupando 63% das posições.
Pontos de melhoria
Mesmo com a evolução na paridade de gênero, o grupo de pesquisadoras aponta pontos que requerem atenção do segmento. “O objetivo deste estudo é identificar oportunidades de promoção da diversidade no ambiente de arbitragem brasileiro, reconhecendo que há sub-representação do gênero feminino e que tribunais diversos tendem a ter uma performance mais qualitativa ao trazer diferentes pontos de vista para as análises e discussões”, explica Weber.
Nas listas de árbitros, considerando 9 instituições respondentes, as mulheres compõem apenas 22,2% dos nomes. Já nos procedimentos com tribunais arbitrais compostos por homens e mulheres, 80% contam com dois homens e uma mulher.
Para Weber, “os esforços devem buscar equilíbrio maior. Em 52% dos tribunais com três membros há ao menos uma mulher, o que é positivo. Porém, para efeito de comparação, apenas 2% dos tribunais são compostos exclusivamente por mulheres. É necessário um trabalho que traga mais árbitras para os tribunais compostos por três membros e também por árbitra única. Um dos caminhos para gerar crescimento orgânico pode ser ampliar a presença de mulheres nas listas de árbitros das instituições. Outro, é incentivar as partes que, ao indicarem os coárbitros, examinem mulheres como possíveis candidatas”.
Além disso, mesmo as mulheres sendo maioria entre os funcionários das instituições arbitrais, em 2020, somente 11% tinham uma mulher na presidência ou posição mais alta na hierarquia e 35% dos membros de seus órgãos deliberativos eram do gênero feminino. Há, no período, maior equilíbrio no cargo de vice-presidente, onde 44% são mulheres.
“Percebemos que há a intenção, por parte das instituições, de tornar suas equipes e as listas de árbitros mais diversas, buscando a equidade de gênero. Neste sentido, continuam necessárias medidas de conscientização que vêm sendo realizadas, como eventos, seminários e diálogo direto com os players da arbitragem. Mas ainda há significativo espaço para incrementar a presença feminina em cargos de gestão das instituições e em tribunais arbitrais”, detalha Weber.
A arbitragem no Brasil
Regulamentada no Brasil em 1996, a arbitragem permite que discussões entre duas ou mais pessoas sejam resolvidas por árbitros especializados, trazendo maior celeridade e precisão aos procedimentos. Segundo dados agrupados com algumas das maiores instituições arbitrais pelo CBAr, a quantidade de arbitragens entrantes no país por ano, entre 2010 e 2021, cresceu 150%. Já os valores envolvidos nos processos por ano cresceram cerca de 20 vezes, evoluindo de R$ 2,8 bilhões em 2010 para R$ 55,2 bilhões em 2021, chegando ao valor acumulado no período de R$ 409,7 bilhões.
Foto de capa: Ana Carolina Weber (Arquivo)