29 de setembro: um chamado global contra o desperdício de alimentos

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A indústria de alimentos carrega uma responsabilidade inegociável: garantir a nutrição e o bem-estar da população sem comprometer o meio ambiente. Dentro dessa missão, reduzir perdas e desperdícios de alimentos é uma das iniciativas mais urgentes e importantes, sendo uma pauta que ganha ainda mais relevância com o Dia Internacional de Conscientização sobre Perdas e Desperdício de Alimentos, celebrado em 29 de setembro. Promovida pela FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura) e pelo PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente), a data tem como objetivo ampliar a sensibilização global sobre os impactos do desperdício na segurança alimentar, nos recursos naturais e no meio ambiente.

De acordo com o relatório “O Estado da Segurança Alimentar e Nutrição no Mundo” (SOFI) de 2025, cerca de 673 milhões de pessoas enfrentaram a fome em 2024, o equivalente a 8,2% da população global. Embora represente uma leve melhora em relação aos anos anteriores, o número ainda é expressivo e preocupa diante das projeções para 2030, que indicam quase 600 milhões de pessoas em situação de desnutrição crônica, cenário que compromete a meta da ONU de erradicar a fome até o fim da década. Entre os principais fatores que agravaram a insegurança alimentar estão a alta dos preços dos alimentos entre 2021 e 2023, impulsionada por eventos como a pandemia de COVID-19 e a guerra na Ucrânia.

Diante desse cenário, combater as perdas e o desperdício de alimentos não deve ser vista apenas como uma boa prática, mas sim compreendida como uma necessidade ética e estratégica. Por isso, a indústria tem a oportunidade de atuar em duas frentes complementares: prevenir perdas e reaproveitar aquilo que não pode ser evitado. A prevenção, naturalmente, deve ser a prioridade, e a excelência se torna uma meta possível, ainda que desafiadora.

Essa transformação exige um sistema de gestão eficiente e integrado, voltado à excelência operacional, envolvendo todas as áreas da organização, não apenas a produção. Embora o investimento em tecnologia possa impulsionar os resultados, a criação de uma cultura organizacional voltada à melhoria contínua muitas vezes gera impactos significativos com menor custo.

No entanto, mesmo com as melhores práticas, algum grau de perda permanece inevitável. Justamente por isso, a reutilização inteligente ganha relevância, ao atribuir novo valor aos resíduos por meio da transformação em subprodutos como matéria-prima para ração animal ou compostagem. Essa abordagem exige uma reflexão crítica: estamos sendo excessivamente rígidos com padrões de aparência, cor ou textura? A segurança alimentar deve ser preservada, mas há espaço para repensar parâmetros sensoriais e explorar o design de produtos como ferramenta na prevenção de perdas.

Além do olhar interno, não podemos esquecer de envolver toda a cadeia produtiva, incluindo órgãos reguladores. Por exemplo, normas sobre datas de validade podem ser revistas com base em evidências científicas, criando diretrizes que incentivem o reaproveitamento seguro. Ciência e inovação precisam estar a serviço dessas transformações.

Outro aspecto fundamental nessa jornada consiste na educação voltada ao consumo consciente, um pilar que sustenta a transformação de comportamento em larga escala. Quando a redução do desperdício estiver incorporada à cultura das pessoas, deixará de ser um tema que exige convencimento e passará a orientar atitudes cotidianas de forma natural. Até que esse cenário se consolide, ações de conscientização precisam ser contínuas, abrangentes e acessíveis a todos os públicos.

A indústria de alimentos está diante de um ponto de inflexão. Reutilizar, repensar e reduzir são verbos que precisam nortear a transição para um sistema mais sustentável, inteligente e responsável. E o momento de agir é agora, antes que as consequências do desperdício se tornem ainda mais irreversíveis.

Por Janaína Padoveze, gerente de Sustentabilidade da Ajinomoto do Brasil